quarta-feira, 18 de julho de 2012

Demersae Nox


  Calou-se eternamente a minh'amada,
  Quando no oceano célere ressoava,
  As tenebrosas vozes qu'eu odiava,
  Pois invites eram a outra morada...

  E num triste naufrágio da invernada,
  Ela foi-se ao abisso, qu'eu jurava,
  Terem lias e mágoa: velha e flava,
  — Daquela que não surge n'Alvorada!

  Por que o meu tesoiro se enterrou
  Nas regiões mefíticas? Caiu
  Rumo ao desconhecido desespero...

  E quando a noute imensa desespera,
  Somente a turva vaga me exaspera;
  Lembrando-me do nosso Amor efêmero...

***
Felipe Valle

* Versos decassílabos no ritmo Heroico(6ª e 10ª).


sexta-feira, 13 de julho de 2012

Ressonâncias d'Um Adeus


 Partindo p'ra bem longe eternamente
Aarão Filho
***

  Desde o dia que tu fostes embora,
  Sinto escorrer de mim funestas lágrimas,
  Pingando face abaixo dores íntimas
  Que se vão com a Dor chorar afora.

  Dentro do peito, rasga o langor, chora,
  Ao ver em pleno dia tais lástimas,
  — Pois nada mais impede as atras freimas! —
  Bem antes renascidas nessa Aurora...

  Tua voz me era linda, penetrante, 
  Ficando inda a beijar os meus ouvidos,
  Que hoje não mais escutam, insensíveis...

  Foi-se com tua morte, coruscante,
  Meus sonhos de ventura, estreitados,
  Ao caixão viver dores aprazíveis.

  ***
Felipe Valle

  * Versos decassílabos no ritmo Heroico (6ª e 10ª).


sexta-feira, 6 de julho de 2012

A Morte em 1914


"Em Bapaume, em Saint-Quentin..."
***

  Repletos de alegrias e de zelos,
  Que nesses corações enredados,
  Pela tristeza excelsa, eram lavados!...
  Como na madrugada de singelos...
  
  Mas a bondade eram dentre castelos
  Deles. Como os demais reconhecidos
  Efeitos da Vigília, tocados...
  Com a mudança vinda aos paralelos...

  Vagam águas que causam-nos sorrisos,
  E refletem um céu extenso e rico,
  Congelando-se a vinda d'um inverno!

  Como naqueles gestos finais, frisos...
  Da casa, da criança, e o traço bélico,
  Que caíram no horrível fim do inferno...

  ***
Felipe Valle

  São Paulo,
  19 de Outubro de 2011.

  * Versos decassílabos no ritmo Heroico (6ª e 10ª).


domingo, 1 de julho de 2012

Triste Realidade




A carne é dolorosa, a carne é triste.
 Guerra-Duval

***
  Não me sobrou nada na vida.
  Desfez-se como a fumaraça,
  Do ledo sonho uma desgraça,
  Outra ilusão minha, vencida...

  Dor que nasceu d'uma crisálida,
  E ascendeu por entre a carnaça.
  De tersa asa, sobrevoou, cassa...
  Todos os dias, vaga a lida...

  Que sensação tão dolorosa,
  Diria eternal e inda penosa,
  Na alma saber que tudo jaz...

  Talento nesta hora eu descri,
  Com ele o Amor, junto, morri,
  Sem no meu peito sentir paz...

  ***
  São Paulo,
  01 de Julho de 2012.

  * Versos octassílabos em Sáfico Quebrado (4ª e 8ª).
  

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Círios Febris



Deixam no céu uma outra luz mortuária
Cruz e Souza
***

 Tenho inda em vida, horrendo em alta febre,
  Uma visão — presságio insofrido. —
  Doí-me o coração tão comprimido
  Por ser esta a chegada tua fúnebre.

  Perfila das visões, teu vislumbre,
  Magoante, vagueia sem um sentido.
  Fere-me na razão de ser regélido;
  — Sino febril que plange e que assim dobre!  —

  Hirto, o leito repousa finalmente,
  Meu corpo que traz lívidos tormentos,
  Crepitando dois círios lentamente...

  Então a Morte vem tão de mansinho,
  E eu digo de meus célicos lamentos:
  — Crepite-me também neste alvarinho.
 
  ***
Felipe Valle

  São Paulo,
  26 de Junho de 2012.

  * Versos decassílabos no ritmo Heroico (6ª e 10ª).

terça-feira, 19 de junho de 2012

Flor de Ciclâmen


A Arca da Graça, Flor de Ciclâmen,
abri na hora da minha morte. Amém.
Guerra-Duval

***
Na minha derradeira hora, suprema,
Os campos de meus lôbregos olhares,
Fanarão as noctívagas das flores.

E o céu d'alacridade, seu emblema,
Tornar-se-á mais roxo pelas dores,
Que carrego, além d'outros mais sofreres...

Sorvendo-me a míngua do mortório,
E contemplando o trágico destino;
Flores dentre as mais belas em silêncio,
Adornarão o olhar meu cristalino.

Anêmica a mão flébil, da Tristeza,
Tocará delicada, finalmente,
Os meus olhos tão cheios da pureza
Perdidos na penumbra opalescente...

***
Felipe Valle

São Paulo,
12 de Junho de 2012.

* Versos decassílabos no ritmo Heroico (6ª e 10ª).

** A disposição estrófica está em Alternativo Parnasiano.



domingo, 10 de junho de 2012

Eu Amo a Tua Sinuosa Brancura

                         
                                                                 E então, como sempre, tu irás me trair.
                                                                                                   Heinrich Heine

***
  Cada vez mais eu amo tua brancura;
  Lábios que me respondem com carícias,
  Olhos desvendadores de delícias!
  E madeixas em sua rica negrura...

  És a mulher, a única procura,
  E entre tantos lugares, e renúncias,
 Achei-me em ti no enigma e me entendias;
  Como a um irmão, senti tua ternura.

  Em mim, achaste tu um novo homem,
  Igualmente ganhamos nosso amém!
  E assim íamos, fartos, de paixão.

  E, por um certo tempo, assim será,
  Porém passado 'sto, tal fim virá;
  Sei qu'eu sentirei o gosto da traição!
***
 Felipe Valle

* Versos decassílabos no ritmo Heroico (6ª e 10ª).